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SINAES completa seu primeiro ciclo avaliativo

Profa. Ana Cristina Canettieri comentando sobre alguns aspectos da LEI do SINAES.

 

- Qual foi a importância do Sinaes para o ensino superior?

A proposta de avaliação da Lei do SINAES, instituída em 2004 pela Lei 10.861, ao determinar, de forma explícita, que os resultados da avaliação das instituições e de seus cursos quando apresentassem conceitos insatisfatórios deveriam ser deflagradas ações corretivas e punitivas, aplicadas pelo Ministério da Educação, estabeleceu-se uma nova ordem para o ensino superior. Talvez tenha sido este o ponto de destaque entre os processos avaliativos existentes anteriores ao ano de 2004, quando os resultados das avaliações, segundo a Lei 9.131 de 1995, o MEC os utilizava “para orientar suas ações voltadas à melhoria da qualidade do ensino e à elevação da qualificação docente”. A Lei 9.131 não fazia, portanto, referência alguma sobre o que aconteceria com instituições que, repetidamente, colecionassem índices negativos de desempenho nas avaliações aplicadas à instituição, ao curso e ao aluno. Talvez tenha sido esta a importância da Lei do SINAES: propor medidas saneadoras às instituições que não obtém desempenhos satisfatórios.


- Que mudanças ocorreram no ensino superior a partir do Sinaes?

Do ponto de vista da elevação da taxa de matrícula no ensino superior, a Lei do SINAES impactou negativamente na abertura de novas faculdades ou de novos cursos, pois os indicadores de qualidade produzidos a partir da Lei do SINAES apresentam critérios de análise indo muito além do razoável para uma instituição iniciar atividades com padrões de qualidade, como exemplo, cito que, para abertura de

curso tecnológico com ótima avaliação, a exigência é ter 100% de mestre ou doutor! Outro exemplo? A exigência de um número extremamente reduzido de alunos por professor – 20. Número este mais adequado às classes de educação infantil.

Com as taxas de conclusão do ensino médio decrescendo, pois muitos ficam pelo meio do caminho do nível fundamental, que não tem qualidade suficiente para garantir boa performance dos educandos para níveis mais elevados de ensino, o que se observa é uma retração do mercado de iniciativas de expansão das atividades no nível superior.

Do ponto de vista da gestão das instituições, o impacto da Lei do SINAES também é forte, na medida em que interfere na estrutura organizacional das instituições ao exigir não só a constituição de uma comissão de avaliação, mas também definindo a sua composição, os seus integrantes e até mesmo a sua nomenclatura e sigla – “CPA - Comissão Própria de Avaliação”. E mais, consta explicitamente na Lei do SINAES que seus integrantes respondem civil, penal e administrativamente pelas informações prestadas. Obviamente que todo cidadão responde por informações prestadas, o que torna totalmente dispensável constar tal “aviso” numa lei educacional!

É fala corrente entre gestores e consultores educacionais sobre o excesso de formulários e de relatórios que, com muita regularidade, as instituições devem preencher para os órgãos de regulação, de supervisão e de avaliação. Nas instituições de pequeno porte, e que se constitui na sua grande maioria no sistema federal de ensino, o excesso de informações e de dados exigidos pelo MEC acarreta um esforço das instituições que tem se mostrado além do suportável, na medida em que as equipes são muito enxutas e com pouca familiaridade às leis educacionais, via de regra, de natureza complexa de interpretação e aplicação, até mesmo para especialistas experientes, sejam eles integrantes de comissões de avaliação, sejam os técnicos do MEC, INEP, CNE, CEE, etc.


- São três os pontos avaliados pelo Sinaes: os cursos, as instituições e o desempenho dos estudantes. Qual deles está mais consolidado e qual ainda precisa de amadurecimento? Por que ou em que sentido?

É lamentável dizer, mas as três avaliações aplicadas pelo MEC ainda não estão consolidadas. A primeira razão para isso deveu-se à quebra de continuidade dos processos avaliativos implantados por força do que dispõe a LDB e a Lei 9.131/95. Após oito anos de experiência em avaliação da graduação - 1995 a 2002, em 2003 há uma página em branco na avaliação do aluno, pois não houve aplicação do Provão. O Provão havia se transformado numa marca positiva na sociedade, incomodando os novos governantes. A segunda, deveu-se ao tempo decorrido até que nova base legal, que veio a ser protagonizada pela Lei do SINAES, fosse aprovada pelo Congresso Nacional, o que acabou ocorrendo somente em abril de 2004.

Para avaliar os cursos de graduação, novos instrumentos de avaliação haveriam de ser elaborados em consonância à concepção e aos princípios constantes da nova Lei. Assim nasceu, após dois anos de aprovação da Lei do SINAES, em 2006, o “Instrumento Único de Avaliação de Cursos de Graduação”, e que teve vida curtíssima, menos de 1 ano! As razões para a breve vida podem ser imputadas, pelos menos, a dois aspectos, primeiro por ser um instrumento único tinha a pretensão muito alargada de abranger as peculiaridades e diversidades da oferta do ensino superior, segundo, e que considero teve maior peso para sua rápida retirada de circulação, diz respeito aos critérios de análises constante do instrumento ÚNICO, que deixaram de ter uma boa dose de indicadores quantitativos e passaram a ter mais indicadores subjetivos. Assim, de um dia para o outro, os referenciais de qualidade então existentes deixaram de servir de referência para avaliar as condições de oferta dos cursos de graduação, o que fez com que colocasse na mão dos avaliadores, quando em visita in loco, uma carga enorme de responsabilidade no juízo de valor. Isso não deu certo, e nem poderia!

Com o fracasso do instrumento único, em 2006, novos instrumentos foram produzidos para avaliar instituições e cursos, que ao longo de 5 anos somaram 13 instrumentos, os quais tiveram várias reformulações, para, em 2011, virem a se transformar, mais uma vez, em 2 instrumentos “únicos” – um voltado para avaliar a instituição e outro voltado, para o curso.Vamos acompanhar até quando vão durar, para desespero dos gestores sejam governamentais, sejam institucionais e para o desalento daqueles que esperam por um ensino de mais qualidade, que sofre negativamente com as mudanças de procedimentos que pouco ou nada agregam de melhorias na formação universitária.

Na avaliação do aluno, feita pelo ENADE, também não é diferente, são constantes as mudanças. E, certamente, das três avaliações – instituições, cursos e alunos, a mais lamentável mudança, em comparação com o que existia, ocorreu com o ENADE. A partir da Lei do SINAES o ENADE passou a ser por amostragem, deixando de contar com a participação de todos os alunos concluintes, como era até então. Também passou a exigir que os alunos ingressantes nos cursos superiores fizessem o Exame, só que a prova era a mesma – isso mesmo, a mesma, para os iniciantes e para os concluintes!

Como ter uma boa avaliação de um aluno que acaba de entrar num curso superior com a mesma prova de um aluno que está no final deste mesmo curso? Some-se a isso a improvável possibilidade do aluno ingressante vir a fazer a prova quando na fase de conclusão de estudos, uma vez que o ENADE, nesta época era somente para uma amostragem de alunos.

Outro fator que contribuiu para a perda do poder de avaliação do aluno, e por meio dele, do curso e, por meio deste, da instituição, foi o ENADE não avaliar todos os cursos num ano só. Com maior custo, sim, mas certamente necessário se ter um cenário mais apurado da qualidade dos cursos de graduação.

O ENADE dividiu em 3 grupos os cursos superiores, no primeiro ano avaliaria x cursos, no segundo ano, mais x cursos e no final de três anos a última parte dos cursos, daí a expressão “ciclo avaliativo do SINAES”, que demorou alguns anos para que gestores governamentais e institucionais compreendessem quando se iniciava ou se encerrava tal ciclo.

O novo formato de avaliação do aluno, por meio do ENADE, tornou-se desestimulante e provocou pouco interesse da sociedade pelo acompanhamento dos resultados, potencializado pelo difícil entendimento dos índices criados – CPC, IGC, CI, CC – que são complexos de entendimento até para especialistas em educação superior!

É importante lembrar que o ENADE vem a cada ano se modificando e chegando mais perto do formato do Provão. Isto é um sinalizador claro de que seria muito mais proveitoso aperfeiçoar o que já existia do que mudar totalmente como foi feito.

Naturalmente que no Provão ainda havia falhas, mas tinha o mérito de mostrar de forma mais simples, especialmente para a sociedade, os resultados do desempenho de alunos e de instituições. E uma importante contribuição do Provão que vinha se consolidando a cada ano, era o entendimento dos segmentos empregadores de que a nota obtida no Exame era um forte indicador do nível de formação acadêmico-profissional recebida. Hoje, ao que parece, o mercado de trabalho carece de informações mais claras e objetivas sobre a importância do ENADE para visualizar um profissional mais bem formado.

Num detalhe ambos processos avaliativos são da mesma forma, qual seja, na apuração dos conceitos. E, sinceramente, não consigo me convencer de que se trata de algo que deva ser assim mesmo. Senão, vejamos:

Independente da nota obtida, a distribuição dos conceitos entre as instituições será assim: 10% estarão entre as muito abaixo da média, e receberão o pior conceito - E, 20%, entre as pouco abaixo da média, 40% estarão na média, 20%, pouco acima da média e o restante 10% bem acima da média, e terão obtido o conceito A. Com isso quero dizer que, se a média mais alta dos alunos de um determinado curso for 4 – numa escala de 0 a 10 – uma instituição poderá ser considerada de excelência mesmo com uma nota abaixo da média!

Com tantas mudanças nos processos avaliativos e de grande vulto e em tempo tão curto, é possível sim afirmar que ainda não há consolidação. Para que os processos avaliativos possam avançar mais rapidamente, se aperfeiçoarem e se consolidarem e trazerem bons frutos para a sociedade é preciso que o tema Avaliação do Ensino Superior seja tratado como política de estado e não de governo. Em sendo assim, os processos avaliativos possam ganhar perenidade, e proporcionar melhores condições de, antes, ser bem compreendidos pela comunidade acadêmica, e daí possibilitar a implementação de forma mais cuidadosa, ampla e aprofundada dos indicadores de qualidade do ensino superior, e daí virem a surtir efeitos positivos na formação dos estudantes de nível superior.

 

Ana Cristina Canettieri, administradora, com pós-graduações em universidades nacionais e internacionais. No período de 1980 a 1992 foi assessora técnica no Ministério da Educação, em Brasília. É sócia diretora da Cadec, desde 1993.